sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Entrevista de Richard Dawkins a revista Época

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26-epocaDesde que Deus – Um Delírio foi publicado, o senhor tem feito uma turnê mundial para disseminar a palavra contra a religião e a favor do ateísmo. O senhor acredita que tem tido sucesso em sua missão?

 

r_dawkinsEu acho que tenho sido consideravelmente bem-sucedido. Se você olhar em meu website, vai ver que ele reflete uma grande dose de entusiasmo por minha mensagem.

 

 

26-epocaMas o senhor tem conseguido atingir o público que necessita ser atingido? As pessoas que acreditam em Deus?

 

 

r_dawkinsSobre isso já não tenho certeza. Sei que conseguimos fazer conversões. Por exemplo, ontem à noite em Chicago, havia uma quantidade significativa de pessoas na fila de autógrafos de meu livro que disseram que ele as ajudou a firmar suas opiniões a respeito de religião. O website e o livro estão atingindo principalmente as que estão indecisas e precisam de um pouco de encorajamento.

 

26-epocaCom base no que o senhor tem visto em suas viagens, qual é a melhor maneira de motivar os ateus em potencial a assumir sua descrença em Deus?

 

 

r_dawkinsEu acredito que, quando vêem que há argumentos fortes em seu favor, e que outras pessoas estão saindo do armário, eles se sentem mais confiantes. Por exemplo, quando notam em minhas palestras que uma grande quantidade de gente está defendendo suas opiniões, ganham coragem para se revelar também.

 

26-epocaO senhor vem dizendo que, se os ateus se organizassem politicamente, eles poderiam exercer grande influência em um país como os Estados Unidos. O senhor acredita que isso um dia poderá acontecer?

 

r_dawkinsSim, acho que sim. Tome como exemplo o movimento judaico, que é imensamente influente nos Estados Unidos. Existem menos judeus praticantes que ateus na América. Então, se você considerar o poder do lobby judaico, terá um forte argumento a favor da organização dos ateus.

 

26-epocaPor outro lado, acreditar em Deus parece algo mais poderoso em termos de unir as pessoas em torno de um objetivo. Pelo menos mais poderoso que a idéia de não acreditar em nada, que é o que as pessoas em geral relacionam com o ateísmo.

 

r_dawkinsEsta é uma boa observação. Mas, quando você vive em um país em que o governo diz tomar decisões com base na religião, você tem um motivo forte para fazer alguma coisa a respeito.

 

 

26-epocaQuais são os principais obstáculos para disseminar suas idéias?
Dawkins

 

 

r_dawkinsHá vários. Alguns temem desagradar a Deus só de ouvir o discurso de um ateu. Outros são apenas ignorantes, nunca ouviram uma boa argumentação científica. E também há o medo da reação da família e dos vizinhos. As pessoas precisam freqüentar a igreja de sua comunidade porque os pais, os avós, ou até mesmo o marido ou a mulher, são religiosos. Daí elas não querem decepcionar nem irritar gente tão próxima assim. Mas boa parte da resistência se deve à ignorância. No sentido de que muitas pessoas não entendem que a ciência não tem de dar uma explicação imediata para tudo o que hoje elas atribuem a Deus.

 

26-epocaSe isso acontece em um país onde os níveis educacionais são razoavelmente altos, como os Estados Unidos, a situação deve ser pior em outros países...

 

 

r_dawkinsVocê imaginaria isso, não é verdade? Entretanto, o fato é que os Estados Unidos têm uma proporção muito mais alta de pessoas que não acreditam na evolução das espécies do que em qualquer país europeu, por exemplo. A única exceção é a Turquia.

 

 

26-epocaO senhor tem planos para levar sua mensagem a países em desenvolvimento onde a religião ocupa um lugar de destaque na sociedade, como o Brasil?

 

 

r_dawkinsJá tive vários convites para fazer palestras no Brasil, o que me deixa contente. Mas não tenho planos imediatos de ir para lá.

 

 

 

26-epocaO senhor acredita que suas idéias teriam impacto em um país como o Brasil?

 

 

r_dawkinsBom, eu acho importante levar essa mensagem para todas as partes do mundo. Espero que um dia seja possível comprovar isso.

 

 

 

26-epocaNo Brasil as pessoas em geral têm uma relação menos radical com a religião que nos Estados Unidos. Mesmo assim, o senhor acha que os ateus brasileiros também deveriam se esforçar em combater a religião?

 

r_dawkinsNão conheço o Brasil, mas o que você está dizendo soa encorajador. Talvez haja uma necessidade menor de combater a religião lá que em outros lugares.

 

 

26-epocaSeu livro afirma que o acesso à educação e à informação é um remédio eficiente contra as superstições e a favor da ciência. Hoje há cada vez mais educação no mundo, e a internet oferece mais informação que nunca. O senhor acredita que o fim da religião seria uma conseqüência lógica do processo de expansão do conhecimento?

 

r_dawkinsGostaria de acreditar que você está certo, e quem sabe esteja. Essa é a atitude de muitos de meus colegas cientistas. Mas considero essa visão um pouco otimista. Em um país como os EUA, onde a religião é tão forte, acredito que é preciso algo mais que simplesmente educar as pessoas a respeito da ciência. É o que estou fazendo.

 

26-epocaSeu livro de certo modo também deixa a impressão de que a ciência traz muitas coisas boas para a humanidade, enquanto a religião promove resultados negativos. Mas a ciência nos deu a bomba atômica e inspirou teorias malucas como a eugenia.

 

r_dawkinsA ciência pode ser usada na produção de coisas ruins como a bomba atômica, mas por si mesma não leva a ações malignas. Entretanto, fazer coisas horríveis é uma parte lógica do processo de acreditar em Deus. Os 19 homens que perpetraram os ataques de 11 de setembro de 2001, por exemplo, talvez não fossem naturalmente malignos. Mas eram profundamente religiosos. Eles achavam que o que estavam fazendo era correto segundo o que acreditavam. E chegaram a essa conclusão de uma forma lógica a partir de seus textos religiosos. Para um ateu, seria impossível realizar um ato similar a partir de uma racionalização lógica.

 

Revista Época                                                   Edição 493 de 26 de setembro de 2007

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